CONTRACHEQUES E SUAS FORMALIDADES NA JUSTIÇA DO TRABALHO
Autor: RAMOS COSTA advocacia
A empresa é notificada acerca de reclamação trabalhista contra ela. Ao acessar os autos, verifica que o ex-empregado está requerendo pagamentos atrasados referentes à adicional noturno, de periculosidade e horas extras. Como cumpridora de seus deveres, pagou todas aquelas parcelas e providencia os contracheques para juntar ao processo.
O que se vê, quase sempre, na prática, é as empresas apresentarem “fichas financeiras” de acordo com os registros armazenados em seus computadores. Entretanto, essas fichas nada mais são do que documentos produzidos unilateralmente pela empresa; sem a assinatura do empregado e não se equiparam aos contracheques.
O advogado do reclamante, em sua manifestação aos documentos, impugna aquelas fichas sob a alegação de que não servem para comprovar qualquer tipo de pagamento, tendo em vista que, foram produzidas a partir de dados lançados pela própria empresa, sem a ciência do empregado e estão todas apócrifas.
Afinal, as fichas financeiras são contracheques? Fazem prova, ou, devem ser invalidadas pelo Juízo?
A primeira vista, pode-se imaginar que aqueles documentos são legítimos, pois, se a falta de assinatura do empregado não invalida os cartões de ponto, também não devem invalidar as fichas financeiras.
A analogia não procede.
Primeiramente, devemos considerar que cartões de ponto e contracheques são documentos de natureza distinta. Os cartões de ponto não são RECIBOS. Dessa forma, não é demais afirmar que um contracheque sem assinatura de quem recebeu é, no mínimo, duvidoso e não poderia gozar de presunção de veracidade.
Se não presume-se verdadeiro e foi impugnado pela parte contrária, temos um sério problema no que tange à comprovação daquelas parcelas.
Mas o que diz a lei?
Está na CLT:
Art. 464. O pagamento do salário deverá ser efetuado contra recibo, assinado pelo empregado; em se tratando de analfabeto, mediante sua impressão digital, ou, não sendo esta possível, a seu rogo.
Parágrafo único. Terá força de recibo o comprovante de depósito em conta bancária, aberta para esse fim em nome de cada empregado, com o consentimento deste, em estabelecimento de crédito, próximo ao local de trabalho.
O legislador equivocou-se ao usar a palava salário. Na verdade, está referindo-se à remuneração (salário e demais parcelas). Tanto é assim, que o Precedente Normativo nº 93 do TST dispõe:
“O pagamento do salário será feito mediante recibo, fornecendo-se cópia ao empregado, com a identificação da empresa, e do qual constarão a remuneração, com a discriminação das parcelas, a quantia líquida paga, os dias trabalhados ou o total da produção, as horas extras e os descontos efetuados, inclusive para a Previdência Social, e o valor correspondente ao FGTS).”
Feita essa observação, resta claro que a lei conferiu tratamento diferenciado para os cartões de ponto e os contracheques. Se, por um lado, não há exigência legal de assinatura do empregado nos controles de frequência, por outro, não resta dúvida de que a assinatura deve estar presente nos recibos de pagamento.
Na impossibilidade de apresentar os recibos, restará a empresa juntar os comprovantes de depósito em conta bancária no nome do empregado, conforme exceção trazida pelo parágrafo único do artigo 464.
A conclusão é lógica e decorre da lei: o pagamento de salário é comprovado por recibo assinado, ou, comprovante de depósito bancário; fichas financeiras sem assinatura não fazem prova.
A questão é relevante, pois, como na hipótese aqui apresentada, uma empresa que tenha cumprido com suas obrigações poderá ser condenada a repetir pagamentos. Neste sentido, cumpre destacar o Acórdão Nº 12368/08, proferido no Recurso Ordinário Nº 00474-2007-015-05-00-8-RO, na 2ª Turma do Egrégio TRT-5, pela Desembargadora Relatora LUÍZA LOMBA:
“Ora, as fichas financeiras, precisamente porque documentos apócrifos de produção unilateral, não têm o condão de fazer prova do pagamento de salários. Note-se, ademais, que tais documentos sequer fazem prova da instituição financeira onde supostamente os valores ali consignados teriam sido depositados. Em verdade, as fichas financeiras possuem finalidade apenas informativa, daí porque poderiam demonstrar pagamento de verbas somente na hipótese de ausência de impugnação da parte contrária. Porém, no caso vertente, como alhures pontuado, houve impugnação àqueles documentos. A natureza alimentar do salário exige total proteção da lei, razão pela o art. 464, da CLT, deixa claro que a prova, por excelência, do seu pagamento se faz mediante recibo – “o pagamento do salário deverá ser efetuado contra recibo” – admitindo-se, contudo, o depósito bancário dos salários em conta corrente aberta em nome do empregado, hipótese esta na qual o comprovante do depósito equivale ao recibo de salário (Lei n. 9.528/97). Não tendo sido emprestada validade às fichas financeiras, por corolário lógico, indevida é a pretendida dedução de valores supostos pagos a título de horas extras. Destarte, precisamente porque não fez prova a reclamada do efetivo depósito em conta corrente do reclamante dos valores consignados nas mencionadas fichas financeiras, merece ser mantida a sentença revisanda que condenou a reclamada no pagamento de horas extras e parcelas reflexas.”
Ainda neste sentido, cumpre transcrever lição do eminente Prof. Sérgio Pinto Martins em sua obra “Comentários à CLT”, 16ª Ed., pág. 447:
O pagamento de salários só pode ser comprovado mediante recibo de pagamento, isto é, a prova deve ser escrita (art. 464 da CLT). Não se admite a prova de tais fatos por meio de testemunhas, pois, no caso, a prova deverá ser feita por documento, por recibo, que é a condição exigida por lei.
É inegável a importância do pagamento do salário na relação de emprego. Destarte, o legislador impôs formalidades com relação à prova do mesmo. Sendo assim, a empresa deve ter máxima diligência na confecção e arquivamento dos contracheques. Caso contrário, estará exposta ao temível “QUEM PAGA ERRADO, PAGA DUAS VEZES”.